domingo, abril 26, 2020

Baldio'




A cor do sangue nem sempre é a mesma.
Há quem diga que o corpo é tela, 
Ou se apoia ou se deita.
Quando não se gosta, se queima ou se rasga…
É desonra quebrar a moldura. 
A cor da dor nem sempre é a mesma. 
Há quem diga que a que se opõe neutraliza, 
Ou apaga ou se mescla.
Quando não se acerta, se lava ou se cobre…
É pecado diluir em outra.
A cor da vida nem sempre é a mesma.
Há quem diga que a arte é livre,
Ou se nasce ou se abstém. 
Quando não se aprende, se copia ou se tenta…
É calúnia explicar porquê.
A cor da dor nem sempre é a mesma.
Algumas surgem da mistura de muitas;
Outras do quanto se usa. A cor da dor nunca é a mesma,
E uma obra nem sempre se termina.
Como quando meu sangue ainda era branco, 
E ele me pintou com os dedos e o barro vermelho.
Limpa.

[Suelen de Miranda]

*https://www.youtube.com/watch?v=YHdBHr6bVxw
Talvez seja uma questão de peso. Talvez o sangue será sempre mais denso que a saliva. 
Tudo que há de bonito não anula, apenas dilui. E a dor é espessa...respinga e mancha. 
Toda vez que nós passávamos pela casa da direita eu pensava em gritar. Toda vez que ela me deixava ir eu pensava em contar. 
Até hoje eu faço a única coisa que eu aprendi com ele. Aguentar. 

quarta-feira, abril 22, 2020

República'

É como se fosse, 
Eu, uma cidade inteira esperando o acordar.
Minhas veias, as ruas que tu nunca irá cruzar. 
Todos os habitantes que um dia eu fui, 
Todas as casas que eu tenho pra oferecer…
Quando tu não me olhas, eu me abandono. 
É como se fosse, 
Tu, uma corrente que delimita sinalizando o começar.
Tuas palavras, as árvores plantadas que eu não sei podar.
Todas as saídas que um dia tu teve,
Todas as fronteiras que tu não quis conhecer…
Quanto eu não te chamo, eu me esqueço.
É como se fosse,
Eu, uma cidade vazia por inteiro;
Meus pés; os postos, e meu peito; o aterro. 
É como se fosse,
Eu, a neblina chovendo nas ruas;
Meus olhos; as esquinas, e minha boca; a entrada.
Não que eu me esqueça de quem me governa…
Mas tu me popula sem democracia.
Mora
.


[Suelen de Miranda]

*Eu me querendo de volta continuo me buscando onde ninguém entrega. Eu sei que não é possível... Eu vivo por dentro de mim desde que nasci, morri e continuei aqui. 
https://www.youtube.com/watch?v=xY1BfWQWqDk
Talvez seja falta de mim. Talvez seja falta de sentir. Talvez seja ela e eu não sei como conseguir.
O que se apoia no outro se tira de si ? Divisão também é soma e subtração.
Me perdoa por não saber mais como apenas existir.

terça-feira, abril 14, 2020

Nó's

Mesmo que não esteja em tempo.
Dos meus dedos correm os grãos sem cair.
Dizem que só nasce em terra boa, 
Mas há tempos em que somos cascalho;
E o que fomos ontem, hoje somos mais.
Mesmo que não seja época. 
Na tua boca fincam as raízes sem ferir.
Dizem que só brota em clima ameno, 
Mas por muitas vezes somos dilúvio;
E o que nos afogou ontem, hoje seca ao sol.
Mesmo que não seja temporada.
De nossas palavras caem as sementes sem partir.
Dizem que só floresce em lugar certo,
Mas há tempos em que somos praga;
E por onde passamos ontem, hoje não ousamos voltar. 
Mesmo que não esteja em tempo…
Pouco a pouco eu viro estufa e tu pouco a pouco me preenche. 
Muito.

[Suelen de Miranda]

*https://www.youtube.com/watch?v=lAwYodrBr2Q
Eu trato de ser minha própria cruz. Me prego uma das mãos e a outra pra sempre sangrando. 
Em dias assim, eu vejo que não sou muito diferente dele. Pegando atalhos pra dormir em lençol de mármore. Nem toda vida vem de outra vida. Eu queria que viesse. 
De qualquer forma, aqui eu permaneço. Fico e agradeço, a flor bonita que brota em mim sem pedir licença. 
Me perdoa por chorar e fazer duvidar. O amor que parte de mim sai sujo da dor e tu tens que tratar de limpar. Se fosse de ouro eu entenderia tua perseverança em me garimpar. Como tu podes enxergar ainda mais valia?